No momento em que a Operação Lava Jato atingiu
o círculo de empreiteiros mais próximo de si, o ex-presidente Luiz Inácio Lula
da Silva começou a disparar críticas públicas contra o PT e o governo da
presidente Dilma Rousseff. Depois de dizer a um grupo de religiosos fundadores
do partido que o governo Dilma e ele mesmo estão no nível do "volume
morto",
O
ex-presidente Lula durante o encontro “Novos Desafios da Democracia” em São
Paulo - 22/06/2015(Paulo Whitaker/Reuters)
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Lula teve um momento de rara sinceridade nesta segunda-feira e
admitiu durante uma conferência em São Paulo que ao PT agora só interessam
cargos, dinheiro e eleição - e que não se fala mais em sonhos no partido.
"O PT perdeu um pouco a utopia. A gente só pensa em cargo, em emprego, em
ser eleito, ninguém hoje trabalha mais de graça [pelo partido]", disse
Lula. "Temos de definir se queremos salvar a nossa pele e os nossos cargos
ou salvar o nosso projeto?".
As
últimas fases da Lava Jato jogaram pressão sobre o grupo político de Lula com
as prisões de Marcelo Odebrecht, da Odebrecht, e Otávio Azevedo, da Andrade
Gutierrez, além das revelações de sua atuação internacional em prol das
empreiteiras, inclusive com detalhes como o apelido "Brahma", como
era intimamente chamado por Léo Pinheiro, da OAS. O avanço das investigações
coincide com a pior avaliação de Dilma, que atingiu 65% de ruim e péssimo e
apenas 10% de ótimo ou bom, conforme pesquisa do Instituto Datafolha.
Em
meio às reflexões, Lula participou de debate com o ex-primeiro-ministro da
Espanha Felipe González, do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE). O
ex-presidente sinalizou que vai buscar uma aproximação com representantes de
novos partidos na Europa, como o Podemos, como forma de inspirar uma
reformulação do PT.
"O
PT era, em 1980, o que é hoje o Podemos. A gente nasceu de um sonho, de que a
classe trabalhadora pudesse ter vez e ter voz, e nós construímos essa
utopia", disse o ex-presidente, ao refletir sobre como recuperar a
ideologia. "Há necessidade de repensarmos a esquerda, o socialismo e o que
fazer quando chegamos ao governo. Enquanto você é oposição é muito fácil ser
democrata você pode sonhar, pensar, acreditar, mas quando você chega ao governo,
precisa fazer, tomar posições."
Lula
repetiu que o partido precisa se reaproximar da juventude e não deixar que
prospere o discurso que afasta as pessoas da política. Uma das principais
críticas internas e externas no PT é o afastamento do governo Dilma da base
social e a falta de renovação nos quadros partidários. "A gente precisa
rediscutir um pouco as utopias para fazer essa meninada sonhar, acreditar que é
possível, se não construir outro mundo, melhorar esse em que nós vivemos",
disse. "Como a gente pode falar em renovação se não tem um jovem
aqui?", questionou olhando para a plateia, selecionada pelo próprio
Instituto Lula.
O
ex-presidente voltou a reclamar da imprensa brasileira, de quem passou a
tripudiar publicamente. "Aqui no Brasil, até o direito de resposta não
temos mais, leva trinta anos e quando sai é melhor nem responder." Lula
afirmou que nove famílias controlam praticamente todos os veículos de
comunicação e que o país está atrasado. "O Brasil está atrasado, a
regulação da mídia aqui é de 1962, não tinha nem fax. E se você fala sobre
isso, leva bordoada de tudo que é lado."
Entre
a série de reclamações, Lula afirmou que é mais difícil manter a postura
democrática depois que se chega ao governo. Mas disse que é importante aprender
a se manter no poder, mantendo as regras da democracia.
Lula
defendeu ainda o Foro de São Paulo - grupo composto por partidos e movimentos
de esquerda da América Latina, criado em 1990. O Foro é um dos temas mais
criticados por movimentos anti-PT e anti-governo. "O Foro de São Paulo foi
criado com a ideia de educar a esquerda latino-americana a praticar a
democracia. Na Argentina, nem o Maradona unificava a esquerda. Hoje, os
partidos de esquerda participam de governos nesses países."
Fonte: Revista Veja
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